O retorno da parceria Pedro Otas e Messias
16 de fevereiro de 2010, terça-feira de carnaval, enquanto boa parte dos homens sonham com as curvas Gracyanne Barbosa no desfile da Grande Rio ou se recuperam da ressaca com a roupa encharcada de suor e álcool, Pedro Otas, 31, prepara a bandagem envolta dos punhos e se prepara pra mais uma sessão de treinos de 6 horas. Retornou ao seu antigo mestre Messias Gomes após 10 anos distantes e se prepara para encarar Ruy da Glória em seu combate de retorno no dia 2 de março.
A separação não veio por causa de uma briga polêmica como ocorre em muitos casos, mas por circunstâncias da vida. Com 20 e poucos anos, o pugilista perdeu seu pai e teve de assumir o papel de homem da casa para auxiliar seu irmão e sua mãe. Passou a trabalhar de segurança durante a noite e “desencanou” do boxe.
Otas tem o apelido de “Rocky Marciano”, seu estilo bruto e rústico lembra o ex-campeão mundial oriundo dos E.U.A. No ringue do Centro Olímpico de São Paulo se sente confortável, solta os braços e soca o ar fazendo o exercício chamado de “sombra”. No tempo que esteve fora treinou sozinho se apoiando apenas com a base que pegou com Messias, uma espécie de figura paterna assim como seu empresário Eduardo Mello.
O atleta paulistano desenvolveu bem sua técnica quando cuidou de si mesmo e fez sessões de sparring com nomes fortes do território nacional como Marcelino Novaes no período em que lutou entre os peso-pesados, mas desde 2007 se encaixou numa categoria de peso abaixo, a dos cruzadores.
Desde 30 de novembro de 2008 não sobe no ringue, ficou afastado por conta de fraturas na mão direita que poderiam ter interrompido sua carreira. No período afastado do ringue estudou os aspectos que cercam o pugilismo e vão além do combate, em um momento o cruzador pergunta: “joga xadrez Leão?”. Conheceu o esporte intelectual no seu exílio pugilístico que hoje o ajuda também a compreender a nobre arte.
Invicto, tem 16 nocautes em 18 lutas, porém precisou esperar sua ferramenta ficar boa para voltar a treinar na sala nomeada “Academia José Aristides Jofre, Escola de Boxe “Kid Jofre” fundada em 1979 em homenagem ao pai do campeão mundial dos galos e penas Éder Jofre. Neste espaço de porte pequeno a voz do homem forte ecoa em um tom alegre: “desenferrujando a máquina”.
A história de Messias Gomes está vinculada a essa sala humilde e asseada. Sua carreira como boxeador profissional não foi nada que fizesse dele um mito ou um grande atleta, mas assim como Felipão teve mais sucesso ao coordenar equipes de futebol, Gomes é recordista de equipes vencedoras no tradicional Forja de Campeões.
Messias começou a lecionar a nobre arte no final da década de 1970, e em 1981 entrou para o Centro Olímpico ficando até 2002 quando decidiu trabalhar com crianças carentes no Rio de Janeiro, voltou em 2007 e praticamente mora no local até hoje.
Ao entrar o visitante se depara com uma espécie de pequeno escritório com computador, fotos de lendas do esporte e troféus de diversas cores, tamanhos e formatos e uma passagem que dá acesso a sala de treinos com um grande espelho servindo para os atletas fazerem seus exercícios. Intercalando o espaço com a imagem refletida dos pupilos de Messias estão posteres de Sugar Ray Robinson, Muhammad Ali, Jack Johnson e Éder Jofre, todos membros do Hall da Fama do Boxe. Os alunos sonham ter a mesma honra que eles.
Os mais jovens tem Otas como exemplo, mas Messias os avisa para “continuar trabalhando e estudando, porque ser campeão não é para todos, e vale mais ser campeão da vida”. O professor se incomoda pela maneira que as autoridades conduzem os esportes e a educação, acredita que se fosse tratada com maior respaldo a juventude encontraria destino melhor do que visto hoje.
Uma representante dessa faixa-etária faz seus movimentos no espaço, Tina Teles, 18 anos, uma mulata jovem que preferiu boxear ao invés de seguir os sonhos mais comuns das meninas de sua idade como protagonizar a novela Malhação, ser destaque de carro alegórico ou desfilar um corpo magro por uma passarela. A adolescente treina silenciosamente e seus punhos e pernas fazem um balé solitário de quem treina buscando uma grande performance no Teatro Municipal.